terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Crônica: O mais novo ornitorrinco do STF



Naquela manhã eu caminhava livremente pelas ruas largas e margeadas por lindos gramados.

O clima ameno e a brisa suave contrastavam com a austeridade dos prédios e a frieza do plano piloto.

Enquanto seguia com os olhos a Esplanada dos Ministérios lembrei-me de como o funcionamento daquela cidade fora idealizado.

Há mais de 20 anos, o povo que veio de vários povos se reuniu naquele lugar e promoveu um dos processos democráticos mais lindos e participativos da história, do qual resultou o Grande Livro.

O povo que veio de vários povos após muitos anos de opressão decidiu que o Grande Livro seria a autoridade suprema contra o arbítrio dos governantes e para isso definiu que as pessoas em seu território só poderiam ser governadas por normas chamadas de patos.

Para que nenhum dos integrantes do povo que veio de vários povos se voltasse contra o Grande Livro e os patos fossem bem tratados decidiu-se criar três casas: a Chocadeira, a Fazenda e a Clínica Veterinária.

Os homens que trabalham na Chocadeira tinham o dever de pensar em novos patos e chocar os ovos até que eles nascessem e estivessem preparados para ir para a Fazenda.

Os homens da Fazenda tinham por obrigação receber os patos da Chocadeira, alimentá-los e dar a eles a utilidade para a qual foram pensados, ou seja, conseguir carne, penas e o que mais o povo que veio de vários povos precisasse.

Os homens da Clínica Veterinária tinham o papel de proteger o Grande Livro e cuidar da saúde dos patos.

Hoje olhando para Chocadeira, para a Fazenda e para a Clínica Veterinária vejo que os homens que lá estão falharam miseravelmente em seguir o Grande Livro.

Há muito a Chocadeira tem produzido patinhos feios em lugar dos patos imaginados pelo Grande Livro e os homens da Fazenda têm alimentado seus próprios gados com os patos, em vez de atender ao interesse do povo que veio de vários povos.   

A última esperança eram os homens da Clínica Veterinária, porém estes se esqueceram que seu papel era cuidar da saúde dos patos e não chocá-los ou fazer experiências genéticas com eles.

Agora por último parece que a esperança se foi...

Um grande coronel da Chocadeira abusou de seu cargo e violou o Grande Livro várias vezes.

Seus pares deveriam eles mesmos dar cumprimento ao Grande Livro e resolver a situação, porém seu compromisso já não é com o Grande Livro ou com o povo que veio de vários povos.

Os homens da Clínica Veterinária não encontrando nenhuma saída no Grande Livro resolveram inventar uma, glosando o Grande Livro com sua pena de pato.

O coronel esperneou e os homens da Clínica por causa de interesses próprios voltaram atrás da glosa e acabaram criando um ornitorrinco.

Ficamos impressionados com o mais novo ornitorrinco, mas a verdade é que no porão na Clínica já tem uma criação de ornitorrincos.

A verdade é que as inúmeras glosas e desrespeitos ao texto do Grande Livro tem tornado a Clínica Veterinária em verdadeira Clínica Clandestina de Experiências Genéticas.

E o povo que veio de vários povos tem tido que alimentar as fazendas dos homens da Fazenda, lidar com os patinhos feios da Chocadeira e aceitar os ornitorrincos da Clínica, como se patos fossem.

O pior é que os estudiosos de patos têm aceitado os ornitorrincos como se fossem supernormais e têm medo de questionar os homens da Clínica.

Acharam que os homens de preto da Clínica eram heróis porque tinham capas, mas esqueceram que também estes deixaram os ensinamentos do Grande Livro.

Na verdade, estes o vilipendiaram da pior forma possível, porque se acharam no direito de reescrevê-lo.

Deixaram o propósito que o Grande Livro os confiou e arvorados em suas vestes pretas passaram a considerar patos os seus próprios arbítrios.

Desolado, o povo que veio de vários povos hoje agoniza e espera por um heroi, mas continua errando pois crê que os homens de preto ajudarão.

Esquecem-se que a solução é e sempre foi o Grande Livro, porém hoje acham que ele é velho e que não serve mais.

O próprio povo que veio de vários povos o rejeita e esquece que ele é de sua autoria.

O Grande Livro não é ensinado nas escolas e é diuturnamente riscado, reescrito e rasgado por aqueles que deveriam preservá-lo.

Eu olho consternado para a frieza dos prédios de pedra, esperando que um dia se lembrem do Grande Livro e o calor humano do povo que veio de vários povos volte a inundar as ruas de Brasília.

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