Já pensou? Tempos de
crise, inflação alta, salário baixo, muitas contas, você leva o carro para o
conserto, atrasa o pagamento e a oficina fica com ele?
Para responder a essa
pergunta, elaborei esse pequeno artigo em linguagem acessível para você que não
é da área do Direito, mas tem carro, contas para pagar e evidentemente
direitos, embora ultimamente eles estejam sendo bem pouco respeitados.
Defeitos
no carro
Foi-se o tempo em que se
podia dizer que carro é luxo.
Apesar de não ser um bem
tão acessível assim ($$$$), com certeza é uma necessidade, haja vista a péssima
qualidade do transporte público.
Pra falar a verdade tá
valendo jumento, charrete, tapete voador e até a nave da Xuxa pra não andar de
ônibus.
Seja novo ou seminovo
mais cedo ou mais tarde seu carro vai apresentar algum defeito e com isso você
terá que levá-lo a uma oficina.
O
contrato
Você pode não saber, mas
levando seu carro à oficina você está fechando um contrato de prestação de
serviço.
Na prática a oficina ou o
mecânico, conforme o caso, se compromete a fazer os reparos em troca de uma
quantia em dinheiro.
Essa quantia que você
paga inclui o valor do serviço e das peças necessárias para o conserto.
Mesmo que esse conserto
seja na rebinboca da parafuseta e você tenha que pagar o valor desviado da
Petrobrás por ele.
O
descumprimento do contrato
Desde os tempos antigos
sabemos que os contratos devem ser cumpridos e que não fazê-lo gera
consequências para a parte inadimplente.
No caso, se a oficina não
consertar o carro ou consertá-lo de modo inapropriado poderá ser acionada
judicialmente para isso, podendo ter que arcar ainda com uma indenização.
Mas, e a oficina? Se eu
não pagar, ela pode ficar com o meu carro?
Direito
de retenção
No Direito Civil existe
um instituto chamado direito de retenção que funciona como uma garantia para o
pagamento de um valor devido enquanto ele não for pago.
Por exemplo, a empresa de
transporte pode ficar com a bagagem do passageiro como garantia em caso de não
pagamento da passagem até que ele seja realizado (art. 742 do CC).
Como estamos em crise e o
Judiciário já era lento antes do corte orçamentário, melhor não testar como
ficou depois.
Assim, na verdade, a
grande pergunta é: a oficina tem direito de retenção?
Já vi pelo menos dois
fundamentos nas decisões judiciais para dizer que sim:
1)
Analogia com o contrato de depósito
No contrato de depósito
uma pessoa se compromete a guardar consigo um bem de outra pessoa e restitui-lo
no tempo estipulado (art. 627 do CC).
De regra, o depósito é
gratuito, mas pode ser oneroso se decorrente de profissão (art. 628 do CC).
Seja como for, o Código
Civil determina que o depositário (quem guarda a coisa) tem direito de retenção
sobre o objeto do depósito como garantia para o pagamento das despesas feitas
com a conservação da coisa (art. 644 do CC).
Assim, alguns precedentes
entendem que o contrato com a oficina se aproxima do contrato de depósito,
visto que ela mantém consigo o veículo para realização de manutenção.
2)
Analogia com a benfeitoria
A benfeitoria é uma alteração
feita em um bem para conservá-lo, melhorá-lo ou embelezá-lo (art. 96 do CC).
A lei dá o direito de
retenção a quem de boa-fé promoveu benfeitorias, até que receba a
correspondente indenização (1.219 do CC).
Diante disso, a oficina
poderia reter o carro.
Conclusão
Particularmente, eu
entendo que existe o direito de retenção conjugando ambos os fundamentos, mas
não aconselharia os donos de oficina a utilizá-lo a não ser em casos extremos.
Isso porque pega mal para
a oficina e eu acho que nesse caso vale mais um bom nome e confiabilidade no
mercado do que o crédito de um único contrato.
Seja como for, ao tomar
uma decisão como essa é interessante checar com um advogado as implicações
jurídicas, afinal às vezes a situação toda pode ser resolvida com uma simples
conversa em vez de acabar em uma batalha judicial cara e desgastante para ambos
os lados.
Além disso, se você
pretende usar esse recurso legal, é bom fazer constar do contrato de prestação
de serviço para evitar a alegação de surpresa ou ausência de informações por
parte do consumidor.
Para o cliente, por via
das dúvidas, é melhor pagar ou renegociar a dívida a se ver privado de seu
veículo, tão essencial para o corre o corre da vida pós-moderna.
Obs.:
A matéria ainda é controversa nos tribunais e se você teve o caso retido é
possível entrar com uma ação de reintegração de posse com pedido de liminar para
reaver o carro.
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